Dom Pedro de Alcântara

Um homem alto e esbelto. Antes, trazia consigo os olhares apaixonados das damas por seu corpo fino e esteticamente vislumbrante. Hoje, carrega olhares de surpreza por conta de seu traje curiosamente antigo. Colete militar, repleto de antigas medalhas sem algum propósito específico. A gola segue até o queixo, enquantoas mangas, até o pulso. Longas e finas calças de algodão, terminando em botas de pura cerimônia. Espada no cinto, entalhada em ouro. Cabelos encaracolados como o de anjos, com costeletas de personalidade. Olhos reluzentes, com a fineza da face de um rei.

Pedro não nasceu para ser um rei, muito menos um Imperador. Mas foi o destino, como múitas outras coisas, que o colocou nessa posição. Ele não aprecia ser considerado alguém comum. Ele é o maior rei que o Brasil já teve, seu primeiro Imperador, quem livrou a pátria amada das garras tirânicas do seu pai. Ele reconhece que não é perfeito, mas também é humilde o suficiente para elogiar apenas seus melhores feitos. Ele não é uma pessoa de obedecer ordens, mas ele sabe que seu povo é mais importante que seu orgulho. Seu povo, apenas.

A mão acaricia as páginas antigas, pouco antes de voltar ao rosto para ajeitar os óculos. Um documento antigo, pertencente ao arquivo do Museu de Brasília. Uma carta entre um historiador e um amigo. Está tão interessado pelo conto, tanto como civil quanto como acadêmico. O documento nunca fora exposto, além de pouco estudado por conta do gradiente de loucura em suas letras! Um documento que cita um documento, estranho. Mas a história é boa, e uma Iniciação científica sobre uma de uma piada dessas não é algo que se consegue com facilidade na UnB! Leu, então, com cuidado, mas interesse verdadeiro:

 ‘Quinze de novembro de 1965, Rio de Janeiro, Limoeiro,

’Caríssimo compadre, como vão as coisas em São Paulo? A situação não é bonita em nenhum lugar, disso eu sei!... Ainda mais em uma data tão contraditória como hoje. Recebi ontem a notícia de que faz uma semana que sua filha não retorna para casa; Tenho certeza de que ela está apenas em uma viagem urgente para santos com os colegas da universidade. Os jovens de hoje em dia! Não deixe sua mente e seus medos te pregarem peças. Ainda hoje li um documento no Museu Nacional que exemplifica muito bem isso. Era um relato da prisão de um velho louco, no século IXX. O homem cedeu aos truques do subconsciente, e o resultado foi perverso. Perversamente hilário. Espero que o relato alegre seu dia e te proteja da sombra de Freud. Começa bem assim:

 “É Sete de Setembro de Mil e Oitocentos e Trinta e Oito e o seguinte texto foi ditado pelo brigadeiro Miguel Araújo de Madeira, da guarda do Rio de Janeiro.

“'O nome do senhor delinquente é Padre Augusto Romeira Vasconcelos. Entrego ele à guarda dos brigadeiros em nome do Presidente José Bonifácio por descomunhão com o estado e disseminação de mentiras entre o povo brasileiro. Foi em frente ao Paço Imperial, em meio à passeata do próprio Presidente.’"

Mas o curioso, em fato, foi que descreveu toda a história “profana“ contada pelo louco! Não é usual para documentos como esse... mAs acho que até entre a força policial ele virou piada.

“’Encontrara el já a implicar, adentrando a`strada para proclamar alto e em bom som:



“”Sou eu Padre Augusto, da Abadia de Nossa Senhora de Monserrate! Eu trago a vós a estória del rei! Acalmais e escuais! Não aera nosso contraterrinho, mas não era nem dos nosso. El rei era uma besta! Bestial fera de pelo sobriu e olhar vil. Lembrai de minhas palavras! No dia do fico, condenaste a nação aos cuidados do danado! Eras líder do alto consejo das feras! Rogai pelas’lmas dos brasileiros, ó senhor. Que foram governados em segredo por tal fera! Que bem que descansa no oceano de uma vez por todas! E não é por má fé que vos conto, mas. Pela graça do senhor, perdoai nosso presidente. El Pesidente sabias de tudo! El era quem guardara o’segredo! Perdoai nosso presidente que peca, ó senhor!""

’"

"





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Pois é agora. Meu pai, João, arquitetou essa junção de coroas. Deixa o Brasil, perde a Terrinha. Vai para portugal, acaba-se a colônia. Mas não é em acabar a colônia que tudo se desaba: Há ainda a possibilidade de manter-se sob a lei das coroas francas, e manter o poder na dinastia. “É isso, então, que ei de fazer, filho. Põe a coroa sobre tua cabeça, antes que algum aventureiro lance mão dela". Nunca me esquecerei dessa brilhante estratégia. Estava velho, sabia o que aconteceria. Sabia que os ventos da revolução já haviam impregnado a terra velha com as sementes do desgosto. Por outro lado, sabia que o Brasil não era mais colônia, e não mais aceitaria ser tratado como uma. Sabia que ele seria o grande império das américas no futuro, quiçá do mundo. Pois não havia francos, castelos ou ingleses que tivessem um império tão coeso quanto o de Portugal. “Deixo em tuas mãos o futuro da nação. Há de manter a coroa para que, quando não mais estiver aqui, possas unir as joias". E era isso que fazia no mar bravio do Atlântico. Após a morte de meu pai, as cortes me convocavam para ascender seu lugar ao trono. Tive de deixar o Brasil nas mãos de Bonifácio, mas ele parece-me ser um bom administrador. E, por um ano, apenas, até que a situação se acalme nos condados lusos para que possa voltar. O Brasil nasceu para ser um império, tem o dever de superar e proteger seu pai.  

É o fim da Europa, sei que o futuro está na nova terra. Acredito no poder do Brasil! Com a unificação das coroas, os laços diplomáticos antigos podem ser mantidos... E fortalecidos. Não mais portugal será um peão na mão dos ibéricos ou dos bretões. Portugal será reino unido ao Brasil mais uma vez! O plano estava a se concretizar...

E foi quando o motim começou. Na Gália, enquanto o navio tornava Sul para seguir em direção ao porto, metade da tripulação do navio se revoltou. A outra metade defendeu seu rei. A vitória foi da coroa, claro, mas não sem contratempos. Fui agredido, uma ferida de tiro grave no torso. O navio foi levado para um porto espanhol o mais rápido possível; sendo que fui socorrido por tropas aliadas. A dor era agonizante. A fortuna, porém, estava de meu lado. El rei e Rainha da Espanha estavam na cidade. Presas de Prata, boa gente... Me conseguiram um acordo.. E esta é a parte importante.  

Uma câmara de ressurreição. Ficaria lá até que fosse curado o suficiente... Não deveria ser mais que vinte anos! Feridas mortais não são grandes obstáculos para magia... Ou não deveriam. Por fim, o tiro era de prata, e fui apenas acordar.... No século XXI. A troca? Um desejo que os próprios monarcas me contariam quando estivesse melhor. Eles já estavam, a muito, mortos; o desejo aparentemente não seria mais dito.

Foi notícia no mundo: Rei brasileiro é encontrado vivo! Gente de boa esperança esse meu povo. A família real de Castela foi boa; falaram que estavam a me esperar; peguei o primeiro navio para o porto de Todos os Santos sem pestanejar. Se conheciam de meu desaparecimento, então por que não tinha a missão ainda?  

A surpresa foi, na verdade, a notícia de que o Império brasileiro não mais o era. Colocaram um farsante em minha posição. Encenaram uma revolução! Nem casado fui, como que tiveram a audácia de... Não. Não há tempo para isso, não há tempo para memórias. Volto a escrever quando estiver sentado no trono. A verdade prevalecerá; Abaixo de Deus, Apenas a coroa! Minha coroa.